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Submitted by eopen on ter, 17/07/2018 – 18:37 Nem todo mundo pode reclamar no Supremopor Lilian MatsuuraA
Reclamação é um instrumento processual célere e eficaz para garantir a
força normativa das decisões do Supremo Tribunal Federal. No entanto,
não é possível que qualquer ato contrário a seus precedentes seja alvo
desse tipo de ação. Apenas as partes do processo julgado pelo Supremo
podem reclamar o descumprimento da decisão.Esta
foi a explicação do ministro Cezar Peluso ao arquivar a Reclamação
proposta por policial federal do Ceará contra decisão judicial que o
impediu de receber reajuste salarial de 84% referente à inflação
apurada em 1990. O policial se baseou em decisão do próprio ministro
Peluso, em que garantiu a outras pessoas o direito de receber 84% de
reajuste (RE 498.843), para entrar com a Reclamação.“A
situação descrita na inicial se não acomoda a nenhuma hipótese de
admissibilidade de Reclamação”, concluiu o ministro. Se todos os atos
contrários às decisões do STF pudessem ser alvo de Reclamação, escreveu
Peluso, “repugnaria à ordem constitucional, sobretudo à democrática, a
possibilidade de se estender àqueles que não tiveram oportunidade de
participar da formação do ato decisório, ou que não estejam submetidos
por força de lei à ordem judicial, a autoridade do pronunciamento da
Corte”.Peluso também diz que, se assim
fosse, todo o sistema processual e a estrutura judiciária estariam
arruinados. E haveria ofensa às garantias de contraditório, ampla
defesa e devido processo legal.Ao defender
este posicionamento, o ministro citou decisão do ministro aposentado
Sydney Sanches, segundo a qual “os julgamentos do STF, nos Conflitos de
Jurisdição e nos Recursos Extraordinários, referidos na Reclamação, têm
eficácia apenas ‘inter partes’, não ‘erga omnes’, por encerrarem,
apenas, controle difuso (‘in concreto’) de constitucionalidade”.
Decisões de Carlos Britto e Ricardo Lewandowski também são relacionadas
em seu voto.Nesta Reclamação, o policial
federal alegava que obteve o direito ao reajuste por meio de decisão
transitada em julgado do Tribunal Regional Federal da 5ª Região,
sediado em Recife (PE). Ele sustentava que o próprio TRF-5 julgou
recurso da União e impediu o pagamento do reajuste, paralisando a
execução da decisão. Isso teria ocorrido anos após a sentença final que
determinou o reajuste.Ao arquivar a ação,
Peluso observou que ela pretendia garantir a autoridade de uma decisão
que não entrou no mérito da questão, por falta de fundamentação do
Recurso Extraordinário, nos termos da Súmula 284.Leia o votoRECLAMAÇÃO 5.852-2 CEARÁRELATOR: MIN. CEZAR PELUSORECLAMANTE(S): ADJACI FLORENTINO DOS SANTOSADVOGADO(A/S): CLAYTON AMORIM DE SOUSARECLAMADO(A/S): JUIZ FEDERAL DA 3ª VARA FEDERAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO CEARÁ (PROCESSO Nº 90.0003711-5)INTERESSADO(A/S): UNIÃOADVOGADO(A/S): ADVOGADO-GERAL DA UNIÃODECISÃO:1.
Trata-se de reclamação, com pedido liminar, movida por Adjaci
Florentino dos Santos, contra decisão do Juízo Federal da 3ª Vara da
Seção Judiciária do Estado do Ceará.A
demanda tem origem em ação ordinária, ajuizada pelo ora reclamante,
servidor do Departamento de Polícia Federal, objetivando a incorporação
“em seus salários do reajuste concernente ao percentual dos 84,32%,
referente à inflação apurada no citado ano de 1990” (fls. 03).Julgada
procedente em primeiro grau, a ação foi submetida à análise do Tribunal
Regional Federal da 5ª Região, que, em remessa oficial, manteve a
decisão a quo.O acórdão transitou em
julgado em 01.07.92 e, contra ele, foi manejada, pela União, ação
rescisória, julgada improcedente. Essa decisão foi atacada, além do
especial, por recurso extraordinário (RE nº 498.843), cuja decisão
alega violada.Argúi, o reclamante, a
“inobservância do AI 410.748/CE posteriormente convertido no RE
498.843/CE em que o Excelentíssimo Ministro Relator Cezar Peluso fez
menção expressa ao direito dos reclamantes de perceberem o percentual
dos 84,32% concedido a estes pela ação de conhecimento nº 90.3711-5 –
título judicial transitado em julgado” (fls. 06).Requer,
liminarmente, “seja deferida a medida liminar inaudita altera parte
pleiteada para que abstenha-se (sic) a autoridade reclamada, por meio
da r. Decisão objeto da presente, de suprimir da folha de pagamento do
reclamante a vantagem concernente a gratificação dos 84,32% assegurada
pela sentença na ação nº 90.3711-5 ajuizada na 3ª Vara Federal do
Estado do Ceará” (fls. 11).2. Inviável a reclamação.A
pretensão do reclamante funda-se em suposta afronta à autoridade da
decisão proferida pela Corte no RE nº 498.843. Ocorre que a situação
descrita na inicial se não acomoda a nenhuma hipótese de
admissibilidade de reclamação.Esta, numa
de suas funções, aparece como instrumento processual célere e eficaz,
franqueado pela Constituição para garantia da força normativa dos
pronunciamentos jurisdicionais do Supremo Tribunal Federal (CF, art.
102, inc. I, alínea “l”; RISTF, art. 156; Lei nº 8.038, de 28.05.90,
art. 13). Trata-se, como se vê logo, de obséquio ao conspícuo papel
desempenhado pela Corte como guarda da Constituição (art. 102, caput).Nesse
contexto, o acesso à reclamação por afronta a decisum do STF somente se
legitima nos casos em que o agente da ação ou da omissão reputada
ofensiva àquela autoridade – a parte dita reclamada – esteja, de
qualquer modo, submetido ao comando decisório (cf. RCL nº 3.159-AgR,
Rel. Min. GILMAR MENDES, DJ de 03.03.2006; RCL nº 4.129, Rel. Min.
GILMAR MENDES, DJ de 30.05.2006; RCL nº 1.770, Rel. Min. CELSO DE
MELLO, DJ de 07.02.2003; RCL nº 1.987, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, DJ de
21.05.2004). “Assim, seu cabimento fica atrelado à clara demonstração
de que os agentes e órgãos vinculados ao cumprimento da decisão
deixaram de observar seus termos e parâmetros” (RCL nº 4.129, Rel. Min.
GILMAR MENDES, DJ de 30.05.2006).Tal
situação configura-se, em primeiro lugar, diante de provimentos
jurisdicionais emitidos pela Corte no exercício do controle concentrado
e abstrato de constitucionalidade, em que sua decisão é dotada de
eficácia e autoridade erga omnes, que a todos subjuga ao comando
normativo.Sujeita-se ainda a controle pela
via de reclamação o descumprimento de qualquer decisão, jurisdicional
ou administrativa, proferida pelo Supremo Tribunal Federal, quando a
violação alegada tenha partido dalgum dos destinatários do comando
decisório, isto é, de pessoas subordinadas à autoridade da norma
singular e concreta, como é o caso das partes do processo em que foi
emitido o decisum tido por afrontado, ou do órgão público a que se
dirige a ordem judicial.Nesse sentido, a jurisprudência:“1.
Os julgamentos do S.T.F., nos Conflitos de Jurisdição e nos Recursos
Extraordinários, referidos na Reclamação, têm eficácia apenas ‘inter
partes’, não ‘erga omnes’, por encerrarem, apenas, controle difuso (‘in
concreto’) de constitucionalidade.2. E
como a Reclamante não foi parte em tais processos, não pode se valer do
art. 102, I, ‘l’, da CF, nem do art. 156 do RISTF, para impedir a
execução de outros julgados em que foi parte, e que sequer chegaram ao
STF.3. A decisão proferida pela Corte, no
julgamento de mérito de ação direta de inconstitucionalidade, esta,
sim, tem eficácia ‘erga omnes’, por envolver o controle concentrado
(‘in abstracto’) de constitucionalidade, mas não comporta execução.”
(RCL nº 447, Rel. Min. SYDNEY SANCHES, DJ de 31.03.95).“Com
efeito, a reclamação constitucional prevista na alínea “l” do inciso I
do artigo 102 da Carta-cidadã revela-se como uma importante via
processual para o fim de preservar a competência desta colenda Corte e
garantir a autoridade das suas decisões. Nesta última hipótese,
contudo, sabe-se que as reclamatórias podem ser manejadas ante o
descumprimento de decisórios proferidos, com efeito vinculante, nas
ações destinadas ao controle abstrato de constitucionalidade, tanto
quanto em processos de índole subjetiva (desde que, neste último caso,
o eventual reclamante deles haja participado).5.
Muito bem. Com os olhos postos no caso concreto, observo que a decisão
tomada no RE 347.814-AgR-Ed não possui efeito vinculante e eficácia
erga omnes, razão pela qual o pronunciamento jurisdicional exarado
nesse feito apenas tem a finalidade de atar as partes nele envolvidas.”
(RCL nº 3.740, Rel. Min. CARLOS BRITTO, DJ de 24.08.2005).“Bem
examinados os autos, vê-se que a pretensão não merece acolhida, pois
não se enquadra em nenhuma das duas hipóteses permissivas inscritas no
art. 102, I, l, da Constituição Federal, seja para preservar a
competência desta Suprema Corte, seja para garantir a autoridade de
suas decisões.É que a decisão proferida
pelo Supremo Tribunal Federal nos autos do HC 82.959/SP, em 23.2.2006,
Relator o Ministro Marco Aurélio, no qual esta Corte declarou,
incidenter tantum, a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº
8.072/90, não possui efeito vinculante e eficácia erga omnes, não
havendo o reclamante figurado na relação processual no referido writ.”
(RCL nº 4.299, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, DJ de 10.05.2006).Fora
desses casos, o impedimento do acesso à reclamação, por afronta a
autoridade de decisão da Corte, é decorrência natural e imediata das
garantias constitucionais da coisa julgada, do contraditório e da ampla
defesa, inerentes à cláusula do due process of law (CF, art. 5º, incs.
XXXVI, LIV e LV). Repugnaria à ordem constitucional, sobretudo à
democrática, a possibilidade de se estender àqueles que não tiveram
oportunidade de participar da formação do ato decisório, ou que não
estejam submetidos por força de lei à ordem judicial, a autoridade do
pronunciamento da Corte. Tal é, aliás, a razão por que a lei adscreve a
coisa julgada às partes entre as quais é dada a decisão (CPC, art.
472). E uma das manifestações da ilegítima extensão dessa autoridade
seria abertura do acesso à via reclamatória, para fazer cessar situação
de suposta ofensa à decisão do Tribunal.É
bem verdade que os atos decisórios do Supremo Tribunal Federal em
processos subjetivos não têm a mesma eficácia daqueles emitidos por
qualquer órgão judicial. Na condição de órgão de cúpula do Poder
Judiciário, responsável pela guarda da Constituição, a Corte empresta a
seus precedentes força sensivelmente superior à ostentada pela
generalidade das decisões judiciais. Para demonstrá-lo, basta lembrar,
em primeiro lugar, os atos de jurisdição proferidos pelo Tribunal no
controle incidental e concreto de constitucionalidade. A declaração de
inconstitucionalidade de norma, manifestada incidenter tantum, habilita
o Senado a suspender-lhe a execução (CF, art. 52, inc. X). Ainda fora
daí, as decisões da Corte são dotadas de força qualificada de
precedente, apta a influenciar em alto grau e, até, predeterminar o
teor de decisões de outros órgãos judiciais (CF, art. 103-A; CPC, arts.
481, § único, 557 e 741, § único).Essa
eficácia diferenciada, naturalmente expansiva, das decisões do Supremo
Tribunal Federal, não autoriza, porém, que qualquer ato contrário a
seus precedentes, imputável a qualquer juízo, obtenha reparação direta
por meio de reclamação à Corte. Tal possibilidade não apenas
constituiria flagrante absurdo, ofensivo às garantias do contraditório,
da ampla defesa e do devido processo legal, e aos limites subjetivos da
coisa julgada, como também arruinaria todo o sistema processual e a
estrutura judiciária.No caso, a decisão
tida por violada limitou-se a negar o seguimento ao recurso
extraordinário, deixando de examinar o restante do mérito da causa
original. Eis o seu inteiro teor:“1.
Trata-se de recurso extraordinário interposto contra acórdão do
Tribunal Regional Federal da 5ª Região que, em julgamento de embargos
infringentes interpostos em face de acórdão que julgou improcedente
ação rescisória, assim decidiu:‘PROCESSUAL
CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES EM AÇÃO RESCISÓRIA. VOTO-VENCIDO. LIMITES
DA DIVERGÊNCIA. RAZÕES DO RECURSO DISSOCIADAS DA MATÉRIA DIVERGENTE.
INADMISSIBILIDADE.Hipótese em que o voto
vencido entendeu violado o art. 97 da Carta Magna em virtude de o órgão
fracionário julgar matéria reservada ao Pleno do Tribunal, enquanto os
embargos infringentes primam apenas em demonstrar a inexistência do
direito reconhecido pela decisão embargada, sem cuidar da matéria
objeto da divergência.“O escopo dos
Embargos Infringentes é restrito à matéria jurídica versada no voto
vencido e à correspondente conclusão nele exposta, por cuja prevalência
forceja, não se admitindo que a parte embargante formule, na via
recursal, pedido que lhe seja alheio. Os Embargos Infringentes não
abrem ensejo ao rejulgamento total e completo (ex novo) da demanda,
como se fosse a repetição da própria lide originária, no caso, da ação
rescisória, daí deverem ser examinados com rigor, para que não se
sacrifique, com a inadmissível renovação do julgamento, o direito que
fora objeto da provisão jurisdicional favorável.”Embargos Infringentes não conhecidos.’O
recorrente, com base no art. 102, III, a, alega violação ao disposto no
artigo 61, § 1º, da Constituição Federal. Aduz que o Supremo Tribunal
Federal se tem pronunciado em sentido contrário ao reajuste de 84,32%
relativo ao IPC de março de 1990 aos vencimentos dos recorridos.2. Inviável o recurso.Há
evidente deficiência na fundamentação do extraordinário, porque as
razões nele deduzidas são destoantes do real conteúdo do aresto
recorrido, o que atrai a aplicação da súmula 284.Com
efeito, o Tribunal a quo concluiu, em sede de embargos infringentes,
que não caberia a discussão quanto ao direito subjetivo dos recorridos
ao índice pleiteado, “porque o dissídio entre os Julgadores não foi por
questão de mérito, mas sim por questão de competência do órgão parcelar
do Tribunal para resolver invocação de proteção constitucional” (fl.
560), que seria a violação ao art. 97, da CF/88.O
recurso extraordinário limita-se a impugnar fundamentos da decisão
rescindenda, quando, no entanto, o acórdão recorrido sequer ultrapassou
preliminar de conhecimento dos embargos infringentes. Isso torna
inviáveis a compreensão e a decisão da controvérsia jurídica. É o que
tem decidido esta Corte, como se vê à seguinte ementa exemplar:‘EMENTA:
AGRAVO REGIMENTAL — IMPUGNAÇÃO RECURSAL QUE NÃO GUARDA PERTINÊNCIA COM
OS FUNDAMENTOS EM QUE SE ASSENTOU O ATO DECISÓRIO QUESTIONADO —
OCORRÊNCIA DE DIVÓRCIO IDEOLÓGICO — INADMISSIBILIDADE — RECURSO
IMPROVIDO. — A ocorrência de divergência temática entre as razões em
que se apóia a petição recursal, de um lado, e os fundamentos que dão
suporte à matéria efetivamente versada na decisão recorrida, de outro,
configura hipótese de divórcio ideológico, que, por comprometer a exata
compreensão do pleito deduzido pela parte recorrente, inviabiliza, ante
a ausência de pertinente impugnação, o acolhimento do recurso
interposto. Precedentes.’ (AI 167.607-AgR, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJ
de 14.05.2004)3. Ante o exposto, nego
seguimento ao recurso (art. 21, § 1º, do RISTF, art. 38 da Lei nº
8.038, de 28.05.90, e art. 557 do CPC).”Desse
modo, os demais pedidos deduzidos pela autora naquele processo não
foram objeto de cognição e pronúncia desta Corte quanto à matéria
jurídico-constitucional de fundo. A última palavra a respeito foi dada
pelo Tribunal a quo, cujo acórdão permanece intacto, na medida em que
não foi substituído por outro de escalão superior (art. 512 do CPC).Ora,
esta reclamação visa a garantir autoridade de decisão desprovida de
conteúdo decisório, que não apreciou o mérito da causa, por deficiência
na fundamentação do extraordinário, nos termos da súmula 284.Inarredável,
pois, a conclusão teórica de que o reclamante terá eleito via
processual imprópria. A fim de sustentar sua pretensão, o autor dispõe
dos meios ordinários de impugnação recursal.3.
Diante do exposto, com fundamento no art. 38 da Lei nº 8.038, de 28 de
maio de 1990, art. 21, § 1º, do RISTF, e art. 267, inc. VI, do CPC,
extingo o processo da reclamação, sem julgamento do mérito.
Oportunamente, arquivem-se.Publique-se. Int..Brasília, 26 de fevereiro de 2008.Ministro CEZAR PELUSORelator Fonte Consultor Jurídico

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